Esperança e desesperança

Ponyville

Fonte: cdn-img.fimfiction.net

SINOPSE: Em um dia quente de verão, Princesa Celestia caminhava pelos campos de Ponyville, onde acabou se deparando com um estranho “pônei”.

Autor: LittleKhan

***

“Bem, meus pequenos pôneis,” Princesa Celestia sorria enquanto saía do castelo de Twilight. “ Foi maravilhoso ver todas vocês novamente. E Fluttershy, obrigada por trazer aquela nova receita de chá, estava delicioso! ”Fluttershy corava e sorria.

“Oh, bem… disponha, alteza. Foi um prazer.” As outras caminhavam atrás dela e paravam no ar quente.

“Bem, todas vocês,” Dizia Applejack, “Foi uma ótima maneira de passar a manhã, mas tenho que voltar ao Rancho Maçã Doce, o Big Mac precisa de ajuda com o plantio”.

“Sim”, dizia Pinkie. “E eu tenho que pegar mais ingredientes na loja do BonBon. Tenho uma remessa de cupcakes para fazer no Torrão de Açúcar.” A princesa Celestia dava a todas outro sorriso caloroso.

“Bem, suponho que todas vocês tenham lugares para estar. Obrigada por passarem algum tempo comigo hoje. Tenha um bom dia, garotas.” Cinco das pôneis disseram seu adeus final e trotaram (ou voaram), embora uma permanecesse. Twilight Sparkle se virava para sua mentora.

“Bem, eu tenho que ir também, Celestia. Tenho um compromisso com a prefeita hoje. Códigos de impostos.” Ela fazia uma careta. Princesa Celestia ria.

“Boa sorte então, Princesa Twilight. Tenho certeza que você se sairá bem.” Twilight revirava os olhos.

“Tenho certeza que vou sobreviver. De qualquer forma, tenha um bom voo de volta!” Em seguida, ela saía correndo.

Princesa Celestia caminhava lentamente até onde seus guardas e a carruagem estavam. Era realmente um dia lindo. O céu era de um azul claro, enquanto apenas algumas nuvens brancas estavam espalhadas. Os pássaros chilreavam e cantavam, e uma brisa suave soprava pela grama. Ela parava na frente da carruagem, fechava os olhos, inclinava a cabeça para trás, respirava fundo e depois expirava. Momentos como esses eram mais raros do que ela gostaria. Canterlot e seus jardins tinham sua própria beleza, mas a princesa Celestia concluía que o esplendor ininterrupto do campo não podia ser substituído por nada. Por um momento, ela ficava ali parada, com uma expressão satisfeita no rosto. Então ela piscava uma vez, abria os olhos e olhava em volta. Era realmente lindo aqui, ao seu redor. Tão pacífico e tranquilo.

De fato…

Uma ideia estava se formando em sua mente. Ela havia planejado voltar para Canterlot e colocar em dia o que estava lendo, mas agora outro pensamento lhe ocorrera.

Eu imagino… bah! Para o tártaro com isso.

Ela se virava para seus guardas, com os cantos de sua boca puxando para cima. “Cavalheiros, mudança nos planos. Decidi fazer uma caminhada. Os guardas piscavam. Eles a encaravam por um momento e então olhavam de volta um para o outro. Em seguida eles tiravam os arreios da carruagem e davam um passo à frente. Com o sorriso ainda em seu rosto, ela se virava e saía caminhando em direção ao campo.

Por um tempo ela apenas caminhava, com os guardas a uma distância respeitosa atrás dela, longe o suficiente para que ela provavelmente não os notasse, mas perto o suficiente caso ela precisasse deles para alguma coisa. A princesa estava gostando disso. Ela vagava pelos arredores de Ponyville sem um objetivo ou destino específico em mente, apenas apreciando a chance de estar fora da cidade, longe da proximidade e dos compromissos de Canterlot.

Eu deveria trazer Luna aqui às vezes.

Quando ela chegava ao topo de uma colina, Princesa Celestia avistava alguém caminhando pelos campos há aproximadamente 100 trotadas à sua frente. Parecia um unicórnio de cor verde escuro, com uma crina marrom e um par de alforjes sobre ele. Ela via quando ele caminhava cerca de uma dúzia de metros, um pouco instável, ela pensava, e se sentava na frente de uma árvore. Ela olhava para o pônei por um momento, se perguntando o que poderia trazer qualquer outro pônei para esse local. O mais provável é que eles não estavam tão longe de Ponyville assim; talvez ele estivesse apenas pensando em apreciar a paisagem, como ela estava fazendo.

Ou talvez não.

Ela achava curioso saber quem era esse pônei e o que ele estava fazendo aqui. Ela poderia simplesmente ir até ele e perguntar, mas não queria ver ninguém se curvando para ela. Não, isso exigia alguma sutileza e planejamento.

Ela virava para a direita e avistava um pequeno bosque. Isso funcionaria. Ela gesticulava para os guardas, e todos se aproximavam. Entrando no bosque, ela fechava os olhos e focava sua magia. Ela lançava o primeiro feitiço. O primeiro só demorou alguns segundos; sua coroa e colar desapareceram com um breve flash. O segundo feitiço foi mais complicado. Era um feitiço temporário de mudança de forma/ilusão. Enquanto seu chifre brilhava, ela começava a encolher. Suas asas desvaneciam-se de vista e seu cabelo perdia a eterealidade habitual, tornando-se um rosa claro. Por fim, sua marca especial mudava, o sol em seu flanco dava lugar a uma estrela dourada de quatro pontas. Esse era um disfarce que ela costumava usar quando queria ou precisava de anonimato entre seus súditos; apenas pouquíssimos pôneis sabiam disso. Depois de uma rápida checagem final da aparência, ela saía do interior do bosque e caminhava para onde havia visto o garanhão se sentar.

Aproximando-se por trás e ligeiramente à sua esquerda, a princesa via que ele não tinha saído. Estava sentado com suas ancas na frente dela, embora um pouco mais encurvado, olhando para Ponyville ao horizonte. Quando a princesa completava as últimas dezenas de metros, notava várias coisas sobre ele. Embora as sombras que a árvore lançava sobre ele o tornassem um pouco difícil de ver, ela podia observar que a crina e o pêlo pareciam sujos e despenteados, como se ele não tivesse tomado banho e/ou escovado por algum tempo. Ele também parecia um pouco magro, quase emaciado. Quando ela chegava mais perto, suas orelhas se animavam e sua cabeça se virava para ela. O rosto do pônei estava na mesma condição que o resto dele: sujo e havia olheiras.

“Olá”, dizia ela, tentando dar-lhe um sorriso mais caloroso enquanto ela encerrava o passo final e sentava-se.

“Olá”. Ele não se virava para ela.

“Eu sou Star Burst. Qual o seu nome?” Dizia Celestia.

“… Meu nome é John.”

Bem, esse era um nome bastante estranho… mas não era o nome mais estranho que a princesa já ouviu. Seu olhar então se dirigia até seu flanco, onde estava sua marca especial, ou pelo menos onde deveria estar.

Este pônei não tinha marca especial. Embora não fosse inédito para um pônei adulto não ter uma, certamente era uma ocorrência muito rara, e também muito debilitante. Quando a Princesa olhava para o rosto dele, notava que ele tinha uma sobrancelha ligeiramente levantada, em uma expressão conhecida, mas resignada. Em um esforço para prosseguir com a conversa, ela gesticulava para seus alforjes.

“Então, pelo que estou vendo parece que você não é daqui.” Dizia John.

“Não, sou nova em Equestria.” Respondia Celestia.

“Sim, dá pra ver.” John assentia, e então seus olhos passavam por ela.

“E por que os guardas?”, Ele perguntava. Celestia olhava para trás.

Oh céus. Me esqueci deles. Ok, pense… como eu explico isso?

“Ah, bem, eu trabalho para a Princesa Celestia. Tinha alguns negócios em Ponyville e decidi dar um passeio. Seus olhos se arregalavam um pouco com a resposta.

“Você trabalha para a Princesa?” Ela respondia a pergunta assentindo com a cabeça. Houve uma pausa desajeitada quando ele parecia considerar isso.

“Então, de onde você é?” Ela perguntava. John hesitava por um momento, e então, seu olhar abaixava.

“De muito longe. É bem provável que você não tenha ouvido falar.”

“Entendo. Posso perguntar por que você decidiu vir para Equestria?” Ela perguntava hesitantemente.

“Eu realmente não tinha muita escolha.” Seu tom de voz combinava com seu olhar novamente resignado. Ela estremecia um pouco por dentro.

“Bem, Equestria é um país muito bom. Tenho certeza que você vai gostar daqui.” Ela sinceramente esperava que ele gostasse. É triste que algum pônei possa parecer tão destituído e sem esperança. Ele inclinava a cabeça, um olhar levemente pensativo deslizava pelo rosto.

“Sabe, é realmente um pouco diferente aqui… mais do que eu pensei que fosse.”

“Oh”, ela perguntava, ambos antecipando e temendo sua resposta. “Como assim?”

“Eu… tive alguns amigos que costumavam falar sobre esse lugar. Eu realmente nunca os escutei muito. Eu estava… ocupado com outras coisas. Acho que… bem, quando você está tão distante, você tende a ver as coisas de uma forma diferente de quando você está realmente lá, vivenciando.” Não era bem essa resposta que Celestia esperava.

“Então, você teve amigos que te falaram sobre Equestria?”

“Sim”. Ele fazia uma pausa novamente. “Eles até me levaram para ver uma… peça de teatro sobre esse lugar uma vez.” Um olhar peculiar pairava sobre ele, um composto de humor e um toque de amargura.

“Hmm. Foi bom?” Ele pensava na resposta, como se não esperasse que ela fizesse tal pergunta.

“Ah bem. Digamos que para uma peça de teatro feita para crianças não foi ruim.” O olhar de humor misturado com a amargura se tornava um pouco mais agudo. Havia outra pausa desajeitada. Ele ficava tenso, como se estivesse discutindo consigo mesmo novamente. Então ele se virava para olhar Celestia.

“Você… trabalha para a Princesa Celestia, certo?” Ela assentia. “Ouvi dizer que houve um incidente um tempo atrás, onde uma ex-aluna dela roubou a coroa da princesa Twilight ou algo assim.” Ela balançava a cabeça novamente, mais hesitantemente desta vez.

“Ah…sim.”

“E isso… não envolveu um espelho mágico que leva a outros mundos, por acaso?” Sua voz subia no final.

“Er, não, não foi. Eu temo que eu não saiba muita coisa sobre esse evento.” Ela não queria decepcioná-lo assim, mesmo que ela não tivesse ideia do que ou porque ele estava fazendo essa pergunta. Sua cabeça se voltava para baixo para observar a grama sob seus cascos dianteiros.

“Eu não penso assim.” Ele esvaziava, sua expressão tornando-se monótona e sem vida novamente. Por um momento, eles apenas ficavam sentados, perdidos em seus próprios pensamentos. A princesa estava quebrando a cabeça, tentando pensar em alguma maneira de descobrir como ajudá-lo.

“Bem, você já pensou em voltar para casa?” Certamente havia pôneis lá que cuidavam dele.

Sua voz estava mais quieta e mais dura que antes. “Receio que não seja possível.” Suas orelhas se dobravam.

“Oh. Eu sinto muito.”Com nada mais para fazer, ela olhava por cima do corpo dele mais uma vez. Ele parecia ter a mesma idade de Twilight e suas amigas, ou talvez um pouco mais velho. Quando ela o examinava novamente, notava algo sobre as orelhas dele, havia alguma coloração amarelada ao redor da parte de baixo.“ Sabe, você parece um pouco doente. Deveria ir ao hospital. Há um em Ponyville.

“Não tenho dinheiro.”

“O que?”

“Dinheiro?”

Ele se virava para ela. “Dinheiro para o hospital.”

“Mas você não precisa de dinheiro para isso. De onde você vem é necessário? Isso deveria ter sido explicado para você quando imigrou para cá.” Ele piscava. Então começava a rir, uma risada que não era inteiramente divertida.

“Claro!”, Ele gritava. “Como eu poderia ser tão estúpido?! hahahaha!” Celestia recuava um pouco, em choque. Ela esperava até que o riso de John cessasse. Ele enxugava algumas lágrimas dos olhos. “Bem, suponho que eu poderia ir para a cidade. Ponyville, certo?” Celestia assentia. “Acho que aqui é um lugar tão bom quanto qualquer outro.”

“Você vai gostar desta cidade. É muito amigável.” Ele bufava para isso.

“Sim, sim, ouvi falar.” A princesa esperava que ele pudesse encontrar uma nova vida aqui, talvez até mesmo arranjar uma casa.

“Sabe, se você está procurando um emprego, acho que o Rancho Maçã Doce está contratando.” John olhava para ela com uma expressão cética em seu rosto.

“Não acho que eles contratariam alguém como eu.”

De fato, ele provavelmente estava certo.

A frustração começava a atormentá-la. Ela odiava quando se envolvia numa situação como essa. Ela era a governante absoluta do reino mais poderoso e próspero do mundo, ela movia o sol, e ainda assim não conseguia ajudar um único pônei a conseguir um emprego… e provavelmente um lugar para morar também, agora que ela pensava sobre isso.

Não, eu tenho que fazer alguma coisa.

Ela respirava fundo. “Diga a eles que Star Burst enviou você.” John escutava, e então franzia a testa.

“Não, está tudo bem”, dizia ele, sacudindo a cabeça. “Eu posso me virar.”

Ela gemia internamente.

“Por favor, pode pelo menos tentar?” Sua voz subia no final, apenas tímida de implorar. Ele olhava para ela por um momento.

“Tudo bem,” ele respondia. Ela sorriu. Então ele se levantava e ela fazia o mesmo.

“Bem, eu deveria ir embora então.” Sua voz ainda não tinha alegria, mas havia uma determinação que não estava lá antes. Ela estava feliz em ouvir isso.

“Boa sorte John,” ela dizia. “Foi bom conhecê-lo.”

“Foi bom te conhecer também,” respondia ele. Com isso, ele se virava e ia embora. Enquanto ele se distanciava, a princesa notava que seu caminhar era um pouco estranho. Quando ele começava a descer o lado da colina, ele diminuía consideravelmente, como se tivesse certeza absoluta de que não tropeçaria ou cairia. Ela não achava que isso poderia ser causado por fome ou qualquer tipo de doença.

O que mais pode estar errado com ele?

Ela definitivamente iria escrever uma carta para Twilight, perguntando se ela poderia dar assistência a ele. Com a bondade e compreensão dos moradores de Ponyville, Celestia sabia que ele ficaria bem.

Então ela se virava e começava a caminhar de volta para a cidade e sua carruagem.

Princesa Celestia, você tem umbigo?

Autor: Foals Errand

Tradução: Drason

SINOPSE: Após um discussão em sala de aula, Twilight tem uma importante pergunta para fazer à sua mentora.

Senhora Flower Petal batia seus cascos juntos, muitas vezes em vão tentando chamar atenção de seus vinte e dois alunos para retornarem aos seus lugares. O recreio havia acabado e eles precisavam terminar seus deveres antes que o sinal tocasse para irem embora. Não era surpresa que apenas uma de suas jovens estudantes voltassem para sua escrivaninha, embora o mais adequado seria afirmar que ela nunca saía de sua carteira em primeiro lugar.

Flower Petal não sabia exatamente o que pensar sobre sua aluna mais jovem. Ela tinha apenas quatro anos de idade em uma sala em que a média era de cinco a seis anos. Ela se encontrava mais uma vez olhando para sua marca especial, o que era bastante precoce para sua idade. Ela sacudia sua cabeça, observando enquanto a jovem unicórnio púrpura abaixava o livro que estava lendo e olhava para ela, lhe dando um breve sorriso antes de retornar seus olhos para o livro.

O chifre de Flower Petal emanava uma aura amarela enquanto um apito enchia a sala. Todas as crianças imediatamente paravam o que faziam e retornavam para seus assentos enquanto ela balançava sua cabeça.

Se apenas eles ouvissem quando eu batesse os cascos.

“Muito bem alunos,” Flower Petal dizia no momento em que a inquietação havia cessado. “O resto da aula estava reservado para nós estudarmos o capítulo um sobre levitação, no entanto, acho que deixaremos essa lição para a próxima segunda. Hoje nós teremos uma discussão muito importante.” Flower Petal sorria enquanto os pequenos unicórnios olhavam para ela curiosos.

“Hoje nós vamos aprender uma nova canção!” Flower Petal irradiava seu chifre antes de levitar seu violão, começando a tocá-lo. “Um unicórnio não tem asas em suas costas, mas um chifre em suas cabeças. Eles são pôneis mágicos.”

Os pequenos unicórnios hesitavam em começar a cantar antes que uma potranca azul se manifestasse, abrindo a boca. “Um unicórnio não tem asas em suas costas, mas um chifre em suas cabeças. Eles são pôneis mágicos!”

Os outros terminavam o verso um pouco mais em voz baixa e Flower Petal estava satisfeita em ver que até mesmo Twilight Sparkle estava murmurando as letras. “Um pegasus tem asas em suas costas, mas não chifres em suas cabeças, eles são pôneis voadores.”

Levou menos tempo para suas estudantes cantarem o verso. “Um pegasus tem asas em suas costas, mas não chifres em suas cabeças, eles são pôneis voadores!”

“…Pôneis voadores.” Flower Petal sorria ouvindo a pequena voz de Twilight terminar o verso.

“Um pônei terrestre não tem asas em suas costas, nem um chifre em sua cabeça, eles são pôneis amorosos.” Ela tocava o violão, com os pequenos alunos ávidos para cantarem.

“Um pônei terrestre não tem asas em suas costas, nem um chifre em sua cabeça, eles são pôneis amorosos!”

“Pôneis amorosos…” Twilight terminava, sua tímida voz ecoava em menor intensidade.

“Um alicornio tem duas asas em suas costas e um chifre em sua cabeça. Eles são os pôneis dominantes.” Ela sorria enquanto os olhos de Twilight iluminavam e sua boca abria em primeiro lugar.

“Um alicornio tem duas asas em suas costas e um chifre em sua cabeça. Eles são os pôneis dominantes!”

Os outros observavam o quão ansiosa Twilight estava e ela nervosamente se encolhia, levando sua calda em seus cascos, dando uma afagada.

Flower Petal suspirava baixinho mas sorria antes de terminar a canção. “E esses são os pôneis amigos de Equestria!”

Sem nem mesmo um momento de hesitação, os alunos cantavam o verso final com a força de seus pulmões. “E esses são os pôneis amigos de Equestria!”

Todos os alunos exceto um. Twilight Sparkle mantinha a cabeça baixa e parecia tentar evitar a sala de aula. Flower Petal suspirava.

Suponho que a Princesa pode estar certa. Talvez seja hora de Twilight ter todas as suas aulas com ela. Seus pensamentos eram interrompidos enquanto ela via um casco rosa acenando no ar. “Sim, Candy Drop?”

“Meu pai disse que unicórnios são su… super… os melhores pôneis. É por isso que estamos em primeiro lugar na música?”

A face de Flower Petal endurecia antes que ela forçasse os cantos da boca para cima. “Claro que não, Candy Drop. Depois de tudo, enquanto unicórnios têm chifres, pegasus são os únicos com asa e pôneis terrestres têm a maior força física de todas. Vamos fazer uma brincadeira, meus pequenos pôneis. Nós aprendemos uma canção sobre as diferenças dos pôneis, mas o que todos os pôneis têm em comum?

As crianças entreolharam antes que um unicórnio marrom levantasse um braço. “Os cascos?”

“Isso mesmo, Cinnamon! O que mais?” Flower Petal sorria enquanto escrevia “cascos” no quadro negro.

“Todos nós temos olhos!” Uma potranca azul sorria enquanto ela saltava de seu assento.

“Exatamente, Cloudy Sky!” Flower Petal escrevia no quadro animadamente. As respostas vinham uma atrás da outra: quatro pernas, orelhas, focinhos, caudas, até que finalmente um potro laranja sorria e gritava.

“Todos nós temos umbigos!”

A mágica de Flower Petal diminuía, fazendo o giz cair. “Ah… sim, sim, Orange Seed. Todos os pôneis têm umbigos.”

Após sua afirmação surpresa, ela pegava o giz para continuar a preencher a lista. Ela percebia que eles estavam começando a ficar entediados, então novamente levitou seu violão. Eles cantavam a música até que o sinal finalmente tocava, anunciando o final da aula.

“Bem, isso é tudo nesta semana.” Flower Petal dizia, para uma sala contente. “Vejo vocês segunda de manhã crianças!” Seus olhos seguiam até Twilight enquanto distraidamente levitava seus livros até seu alforje.

Exceto você, minha querida Twilight Sparkle. “Twilight, lembre-se de ficar em sua carteira até te buscarem.”

Um minúsculo aceno da unicórnio roxo era sua única resposta. Alguns momentos depois, um pegasus branco vestido com uma armadura amarela chegava.

“Senhorita Sparkle, você está pronta?” Seus lábios quase se contraíam em um sorriso enquanto Twilight se levantava fechando seu alforje depois de recuperar o equilíbrio. Ela trotava até o guarda real e olhava para cima.

“Tchau, senhorita Flower Petal. Vejo você na segunda.”

Flower Petal sorria. “Tenha um ótimo fim de semana, Twilight!” Espero que algum dia eu ouça coisas maravilhosas sobre você. Adeus, minha estudante.

Twilight acenava e seguia o guarda até a carruagem. Ela se sentava, olhando para o chão, dobrando subitamente seus ouvidos enquanto pensava em suas lições. O guarda olhava para ela franzindo a testa. Normalmente, a unicórnio roxo brincava com sua magia sempre que ele a escoltava para as lições com a Princesa. O guarda sacudia sua cabeça, ciente que a Princesa seria capaz de trazer o ânimo de Twilight de volta.

Princesa Celestia franzia enquanto ela percebia pela terceira vez que sua fiel estudante parava de prestar atenção. “Twilight? O que foi? Você sabe que pode me contar qualquer coisa.” Ela sorria de uma forma que esperava ser reconfortante.

Twilight olhava para cima, com seus ouvidos dobrados enquanto ela olhava para os olhos magenta de Celestia antes de olhar de volta para o chão arrastando seu casco. “Você vai achar que é bobo.”

Celestia sorria. “Twilight Sparkle, e se eu dissesse a você alguma coisa sobre mim que é muito bobo?”

A cabeça de Twilight levantava incrédula. “Boba, você? Mas Princesa, você é perfeita!”

Celestia riu. “Oh, Twilight, todos os pôneis têm algo de bobo, até eu! Quer saber o que é?”

Twilight sorria e acenava. “Tudo bem!”

Celestia olhava em volta para se certificar que não havia mais ninguém por perto além delas mesmas. Satisfeita se certificando que eram apenas ela e Twilight, a alicornio branca suspirava e engolia vários doces. Ela olhava para os grandes olhos púrpuras e confiantes de Twilight. “Isso é um pouco bobo, Twilight, então você precisa guardar segredo… mas você sabe o quanto eu adoro doces, certo?”

Celestia mal evitava os roncos enquanto ela via Twilight acenar, tentando não rolar os olhos. Infelizmente, Twilight ainda era muito jovem para controlar suas emoções como um adulto. Celestia permitiu uma risadinha.

“Sim, mas eu suponho que isso não seja exatamente um segredo, não é? Twilight balançava a cabeça. “Digo, definitivamente não é, Princesa Celestia.”

Celestia sorria. Oh, como eu adoro esta pequena pônei. Ela é tão honesta. “Bem, e você sabia que eu não sei cozinhar e nem assar?”

Twilight olhava e então sorria. “M-mesmo?”

Celestia corava enquanto sorria colocando um casco em seu peito. “Do fundo do meu coração. Eu tentei aprender mais vezes do que posso contar, mas nunca deu certo. Certo dia eu consegui congelar uma panela de água fervente, e ainda fiz diplomatas visitantes irem que nem um foguete para o banheiro depois de provarem minha sopa. Fui permanentemente banida da cozinha real.”

Twilight não aguentava mais; ela começava a rir. Celestia estremecia, mas então juntou-se a ela até que as duas começaram a chorar de tanto rir. Logo, no entanto, Twilight estava aconchegada no corpo de Celestia.

Celestia cobria a pequena unicórnio roxo com suas asas. Ela suspirava com um sorriso gentil. “Bem, minha fiel aluna, eu disse a você sobre minhas coisas bobas, agora é a sua vez.” Celestia abria suas asas e Twilight sorria entes de concordar.

Twilight abria sua boca e em seguida fechava. Franzindo a testa, ela finalmente abria sua boca e deixava sair. “Princesa Celestia, você tem umbigo?”

Celestia piscava. Ela estava viva por muito, muito tempo e várias perguntas haviam sido feitas a ela, mas esta foi a primeira vez que alguém perguntou se ela tinha um umbigo. Bem, Twilight estava certa, essa é uma pergunta boba. Ela sorria para Twilight, esperando obter um pouco mais de explicação.

“Hum… bem,” Twilight continuava, “na aula nós aprendemos uma canção interessante sobre como os pôneis são diferentes uns dos outros. Então, senhorita Flower Petal nos fez pensar até onde éramos semelhantes. Orange Seed disse que nós todos temos umbigos e eu estava apenas me perguntando. Digo, eu sei que você é um pônei e se você não tiver um isso não vai mudar nada mas… você tem?” As orelhas de Twilight se levantavam enquanto ela balbuciava, com sua calda entre as pernas.

Depois de um momento, Celestia ria e se deitava no chão da biblioteca. Ela rolava de costas com suas asas espalhadas, revelando sua barriga ligeiramente estufada. “Bem, minha fiel estudante, por que você mesma não me diz?”

Twilight inclinava a cabeça, e trotava mais perto olhando para a barriga de sua mentora, seus ouvidos balançavam enquanto ela engasgava de alegria. “Você tem! Você tem! Princesa Celestia, você tem umbigo!”

Celestia observava enquanto Twilight saltava ao redor. A barreira final entre nós foi perfurada. Estou tão orgulhosa de você.

Não levou muito tempo para Twilight ficar esgotada com seus saltos. Percebendo que sua lição estava feita, Celestia levitou Twilight até suas costas e a carregou até o quarto situado ao lado dela própria. Celestia a colocava cuidadosamente em sua cama enquanto um pequeno casco púrpura tocava seu focinho e Twilight bocejava. Celestia beijava sua testa. “Tenha uma boa noite, Twilight. Vou acordá-la para o café da manhã.”

“Boa noite Princesa.. te amo.” Twilight murmurava. Sua respiração desacelerava enquanto ela caía em um sono profundo.

Celestia pausava e sorria. “E eu te amo também, Twilight.” Ela olhava para o mural na parede do céu noturno de Twilight, seus olhos pousavam sobre a imagem da égua na lua. “E eu amo você também, Luna.”

Celestia assoprava a vela e trotava para fora do quarto enquanto ela sorria, pausando por um momento entes de fechar a porta do quarto de Twilight.

“Com umbigo e tudo.”

A viagem de Trixie

Trixie e Mel

Ilustração: Drason

 

Autor: Drason

SINOPSE: Ao descobrir que Twilight utilizou um feitiço para voltar no tempo, Trixie tentou fazer o mesmo para corrigir seus erros do passado. Porém, ao invés de se deslocar no tempo, a unicornio é transportada para outra dimensão, um lugar onde suas crenças e seus valores iriam mudar completamente.

– – – – –

No centro da cidade de Manehatan, uma unicórnio azul agitava seu chifre banhado por uma aura. Ela havia recebido autorização do prefeito local para realizar um experimento, que se realmente desse certo, dispensaria o trabalho moroso e pesado dos pegasus com o clima. Consistia em um sistema inovador de se criar instantaneamente nuvens carregadas de água que se dissipariam imediatamente após a chuva. Esse tipo de magia já existia, mas não a ponto de cobrir uma cidade inteira do tamanho de Manehatan, o que tornaria seu experimento inovador e até polêmico, já que o trabalho dos pegasus poderia ficar em última instância.

Depois do ocorrido em Ponyville, Trixie queria de qualquer forma apagar a má fama que havia adquirido. Não havia sido a primeira vez que ela enganou o público em suas apresentações sobre ter derrotado criaturas ferozes como a ursa maior e sabia que era só uma questão de tempo até que a notícia se espalhasse por todas as cidades em que ela havia passado.  Então, para não comprometer sua reputação, teve a ideia de criar algo inovador e único do que simplesmente mais um show cheio de truques que certamente não chamaria a atenção de mais ninguém.

Uma multidão curiosa ficava na expectativa observando o céu enquanto Trixie se preparava. A magia, de fato, funcionou corretamente no início, cobrindo a cidade inteira de nuvens tão carregadas de água que Manehattan inteira ficou às escuras. No entanto, diferente do que a unicórnio azul havia previsto, as nuvens não se dissiparam, e no final foi necessário um exército de pegasus para conter as nuvens antes que a cidade inteira desaparecesse sob um “oceano”. Essa havia sido a gota d’água para sua reputação como mágica, literalmente.

Trixie atribuía o ocorrido em Ponyville pelas falhas posteriores, é como se aquele evento, de alguma forma, a tivesse afetado psicologicamente, tirando sua concentração em tudo que fazia. Ela acreditava veemente nessa ligação e tudo que passava em sua mente desde então era uma maneira de apagar o seu malogrado passado. A unicórnio azul só não esperava que um dia essa oportunidade pudesse vir até ela no sentido literal da palavra.

Certo dia, ouviu Pinkie Pie comentar com suas amigas no Torrão de Açúcar que Twilight havia voltado no tempo usando um feitiço que aprendeu na biblioteca de Canterlot. A reação de suas amigas foi obvia: uma gargalhada coletiva; todas deram risada da pônei rosa, com exceção de Trixie. Ela já havia ouvido falar de um livro que ensinava tal magia, mas nunca acreditou que realmente existia, tampouco chegou a se interessar por ele, pelo menos não até aquela dia, especialmente ao ficar sabendo que foi Twilight Sparkle quem o manuseou.

“Oras…” pensou. “Se eu usasse esse feitiço para voltar no tempo e utilizar as mesmas técnicas que Twilight usou para derrotar a Ursa Menor, o problema estaria resolvido.”

Do Torrão de Açúcar, a unicórnio azul rumou até Canterlot na biblioteca do castelo, na esperança de encontrar o livro. O que ela não esperava era se deparar com tantas prateleiras repletas de enciclopédias e pergaminhos, a levando a pensar que encontrar uma agulha no palheiro seria mais fácil. Embora pudesse simplesmente perguntar para a bibliotecária, ela duvidava que um livro potencialmente tão perigoso estivesse acessível ao público, mas o seu trunfo estava em uma técnica que seu pai havia ensinado a ela. Embora se recusasse a seguir a profissão de detetive do pai, ela achou interessante aprender a magia de “rastreamento de energia”, que poderia ser comparado a uma impressão digital. Cada pônei possuía uma consistência energética única, o que facilitava identificar tudo o que tocava.

Para um unicórnio, a facilidade de reconhecer a consistência energética de um pônei era similar em reconhecer a voz de alguém, e considerando tudo o que ela testemunhou de Twilight, ficaria fácil descobrir em qual livro na biblioteca a alicórnio roxo tocou.  No entanto, seu sorriso logo se desmanchou ao ver centenas de livros na biblioteca brilhando com a aura roxa de Twilight Sparkle; parecia que ela havia lido mais da metade da biblioteca.

Pouco mais de uma hora fazendo um pente fino, ela finalmente encontrou um livro intitulado “deslocamento no espaço/tempo dimensional”. Ainda era cedo para constatar se realmente seria aquele livro, mas depois de observar outras dezenas de prateleiras brilhando com a aura de Twilight, ela preferiu correr o risco.

Trixie colocava o livro aberto cuidadosamente sobre o chão e concentrava energia na ponta de seu chifre para iniciar o feitiço. Uma aura azul envolvia todo o seu corpo, e aparentemente tudo estava de acordo com as instruções do livro, faltava apenas a último passo que a levaria de volta no tempo, cerca de trinta minutos antes da ursa menor invadir Ponyville. Foi nessa parte que ela percebeu seu erro ao querer fazer as coisas com pressa, sem ter estudado o livro adequadamente: o último passo se referia apenas a um deslocamento dimensional mas não mencionava nada sobre deslocamento temporal, o que deixou a unicórnio na dúvida se ambos os termos seriam a mesma coisa, e naquele ponto ela não sabia como cancelar a magia. Em pânico, Trixie relia o livro às pressas para encontrar alguma instrução de cancelamento, mas já era tarde; um portal dimensional surgiu bem embaixo de seus cascos, revelando um lugar completamente diferente da biblioteca, onde ela acabou sendo sugada e caindo em uma estrada de terra. A unicórnio azul levantava atordoada, observando indignada seu chapéu e capa sujos de poeira; em seguida, observava atônita uma região que parecia estar bem longe do castelo e até mesmo de Canterlot, onde uma pequena casa próxima de um riacho próximo e várias animais andando pelos arredores chamou sua atenção.

“Funcionou!! Aquela casa pertence a uma pegasus amarela!” Ela acreditava ser a casa de Fluttershy, porque antes de apresentar seu show em Ponyville, se lembrou de ter passado em frente a observando cuidar de vários animais.

Ela corria animada em direção a Ponyville, onde esperava se encontrar consigo mesma e explicar como derrotar a ursa menor, exatamente como Twilight havia feito. Mas a cidade não estava lá, em seu lugar não havia nada senão um vasto campo desmatado. Quando voltou para a suposta casa de Fluttershy, viu uma criatura que jamais presenciou antes. Estava andando apenas com duas pernas, e em seu ombro parecia carregar algum tipo de instrumento agrícola; logo atrás surgiu mais uma saindo da casa, mas com o dobro do tamanho da primeira.

“Onde eu..estou?!”

Trixie ficava em pânico ao suspeitar que não estava mais em Equestria. O deslocamento, de fato, havia sido dimensional e não temporal. Ela olhava para os lados procurando o livro em desespero quando a criatura menor a observou na estrada de terra, se aproximando curiosa. A pônei azul ficava imóvel de medo, até aquele estranho ser ficar parado apenas três metros de distância dela. Agora Trixie podia vê-la nitidamente. Tinha um cabelo castanho longo, olhos verdes e uma roupa judiada com o tempo. Ela esboçava um sorriso, maravilhada com aquela pequena unicórnio azul. Quando se aproximou mais, porém, Trixie saiu em disparada correndo em direção aos campos desmatados, não dando importância nem mesmo ao seu chapéu que ficou para trás.

Em meio ao pânico, correu olhando por cima do ombro para ver se não estava sendo seguida, sem perceber que seguia em direção de um penhasco. Quando se deu conta já era tarde, e acabou caindo cerca de vinte metros de altura. Por sorte, caiu em cima de uma árvore, onde foi batendo em vários galhos até finalmente chegar ao chão. Ela olhava atordoada para os lados, antes de ficar com a visão turva a acabar inconsciente.

Quando acordou, tinha medo até mesmo de abrir os olhos. A única coisa que queria naquele momento era a certeza de que tudo não passou de um pesadelo. Mas logo começou a ouvir o som da correnteza do riacho e os animais do lado de fora da casa. Quando abriu os olhos, se deparou com um teto de madeira desgastado com o tempo assim como resto do quarto em que estava, um armário com várias bonecas sobre ele além de muitas ataduras em seu corpo. Perto dela estava aquele mesmo ser bípede de antes sentado em uma cadeira, olhando para a unicórnio. Observando novamente os curativos, imaginou que não lhe faria mal.

A criatura de cabelos castanhos colocou o chapéu e capa de Trixie em cima de uma raque que ficava ao lado da cabeceira da cama. Analisando a reação da unicórnio a azul, ficava claro para ela que sua capacidade de discernimento parecia acima de um animal comum. Dessa forma, tentou se comunicar com sua voz feminina, mas Trixie não entendia nada. Foi onde se lembrou de uma magia que possibilitava compreender outras línguas. “Pelo menos nessa parte fiz meu dever de casa.” pensou Trixie antes de executar a magia.

A criatura novamente falava: “você.. consegue me entender..?” Agora Trixie compreendia perfeitamente o que ela dizia.

“Sim… quem ou que é você? E que lugar é esse?”

A humana sorria. Para ela, ver aquela pônei se comunicar era como um milagre. “Meu nome é Melissa, mas todo mundo me chama de Mel.”

Antes que Trixie pudesse responder, ela corria para fora do quarto e voltava com a outra que tinha o dobro do seu tamanho.

“Ela pode falar!” comentava antes de se voltar para a unicórnio.” Essa é a minha irmã, o nome dela é Elen!”

Elen olhava para Trixie admirada e confusa ao mesmo tempo. A expressão no rosto das duas irmãs transmitia claramente para Trixie a ideia de que nunca viram um unicórnio antes. “De onde você veio e quem é o seu dono?” Perguntava Elen.

“Dono??” Trixie retrucava indignada. “Eu não tenho nenhum dono! eu…” Ela tentava levantar, mas seus ferimentos a impediam. “Eu sou de Equestria e vim parar aqui por acidente.”

“Equestria? Onde fica isso?” Elen franzia a testa enquanto perguntava, o que fez Trixie se lembrar imediatamente do livro.

“O livro!… preciso do meu livro! Foi ele que me trouxe aqui, e é a única coisa que poderá me levar de volta! Deve ter caído em algum lugar aqui perto, por acaso vocês não o viram?”

As duas irmãs olhavam uma para a outra confusas. Sem entender como um livro poderia realizar tal ato, Elen apenas mexia a cabeça negativamente. “Eu sinto muito. Tudo que posso lhe dizer é que agora você está na Terra e… bem. Não chegou em um bom momento. Talvez amanhã quando estiver melhor poderemos ajudá-la a procurar, mas agora é melhor você descansar.”

Antes de perguntar o que Elen quis dizer, Trixie apenas acenou, acreditando que com sua técnica de rastreamento de energia poderia encontrar o livro facilmente logo de manhã.

“Posso dormir com ela Elen?” perguntava Mel. Trixie olhava para Elen com um semblante visível de “não quero”. Então a irmã mais velha permitiu que a pônei azul descansasse sozinha no quarto. Ao amanhecer, Trixie finalmente conseguiu se levantar. Ela passeava pelo corredor da pequena casa, com cada passo fazendo as frágeis tábuas do chão de madeira rangerem, a casa toda parecia precisar de uma reforma, e ela não entendia como as duas suportavam morar naquele local, até finalmente as encontrar na cozinha e se deparar com uma cena assustadora, pelo menos para ela.

Uma das pernas de Mel estava em cima da mesa, com Elen mexendo nela. “O que em nome de Celestia você pensa que está fazendo??” Trixie perguntava atônita.

“Está tudo bem…” Respondia Mel. “É apenas uma prótese, eu perdi a minha perna verdadeira por causa da guerra.” A unicórnio azul sabia muito bem o significado de guerra, mas para ela era praticamente um mito, já que segundo a história de Equestria, a última guerra havia ocorrido há milênios. Se por um lado ela estava espantada com a cena, lhe chamou ainda mais atenção a naturalidade com que Mel havia falado sobre seu ferimento. Será que os humanos estavam tão acostumados assim com coisas ruins? Por um momento, Trixie se esquecia do livro e sentia alguma compaixão por ela, uma criança ferida gravemente era algo que a unicornio jamais poderia imaginar em sua vida, algo justificável para os padrões de Equestria onde amor e tolerância era uma cultura universal. Mal fazia um dia que a unicórnio estava naquele mundo, e ainda assim foi capaz de sentir uma mistura de sentimentos que jamais experimentara antes. Agora Trixie entendia o que Elen quis dizer sobre ter chegado em um “mal momento”.

Mel se levantava lentamente com a prótese já encaixada, ela se dirigia até o forno a lenha e em seguida levava até a mesa uma fôrma contendo pão caseiro, oferecendo para Trixie. “Fui eu que fiz!” Apesar de tudo, ela parecia contente, algo que a unicórnio azul não conseguia entender. Como ela poderia estar feliz naquele estado e ainda morando em uma casa tão desconfortável?

Esboçando um sorriso, Trixie aceitava educadamente o pão, se sentando em uma das cadeiras enquanto comia em silêncio. Mas o retrato de dois humanos aparentemente mais velhos sob e mesa logo a fez quebrar a quietude.

“Seus pais?”

“Sim, eles… eram.” Respondia Elen.

Pela expressão das duas irmãs, Trixie já havia compreendido o significado da resposta de Elen, incrédula com a quantidade de sentimentos tristes que chegavam até ela a cada minuto; suas frustrações em Equestria a fazia até se sentir envergonhada, não era absolutamente nada perto do que aquelas duas pareciam suportar.

“Fazia tempo que eu não via você tão contente Mel.” Dizia Elen enquanto se levantava da mesa e caminhava para fora da casa. Era como se o comentário de Elen respondesse a pergunta que a unicórnio havia feito para si mesma. Sua simples presença havia mudado a vida sofrida daquela criança, e se antes estava ansiosa para voltar para Equestria, agora se encontrava em um dilema consigo mesma. Repentinamente, Elen voltava com o livro em suas mãos, o colocando sobre a mesa na frente de Trixie, a surpreendendo pela facilidade com que havia sido encontrado. “Não foi difícil de achar,” Dizia Elen. “Seu livro é tão distinto e chamativo quanto você.”

Trixie ignorava Elen, mordendo os lábios enquanto olhava para Mel. Aquela criança era tão meiga, e seu coração picava ao imaginar seu sorriso desmanchando depois que ela partisse. Com seu chifre brilhando, ela começava a folhear o livro procurando pelo feitiço de retorno, e logo observava as duas espantadas. Ficou claro para ela que magia e telecinese não era algo exatamente comum naquele mundo. Finalmente, descobriu que não precisaria fazer nada para voltar. Sua estadia na Terra era temporária, exatamente como Twilight que ficou um determinado tempo no passado e depois automaticamente voltou para o presente, embora não mencionasse a quantidade de tempo que Trixie fosse ficar, apenas indicava “dias”.

Dessa forma, Trixie simplesmente tomou a decisão de ficar ao lado de Mel o máximo de tempo possível durante sua passagem temporária na Terra. Se por um lado a unicórnio queria impressionar o público, por trás disso também estava sua vontade de ser prestativa em algo, de querer contribuir com alguma coisa que pudesse melhorar o mundo, um sentimento de perfeccionismo comum na maioria dos unicórnios. Ela finalmente descobriu que essa utilidade era um tipo de magia que não precisava de seu chifre de unicórnio para funcionar, apenas de seu sentimento de amor, e isso não era difícil para um pônei.

Conforme os dias passavam, pessoas começavam a visitar a casa de Mel. Elen havia espalhado por todo o vilarejo próximo sobre Trixie, o que não agradou em nada a unicórnio, sem saber quais eram as intenções da irmã mais velha. O lado bom é que agora poderia sair livremente da casa, sem que sua presença alarmasse os habitantes da pequena cidade que já a conheciam, local em que ela pôde visitar pela primeira vez, apesar do desconforto de tantos olhares curiosos voltados para ela. As casas e prédios danificados por causa da guerra pareciam recentes, mas Trixie conseguia restaurá-los com sua magia, os deixando com aparência de novos.

Foi algo que a pegou de surpresa, pois em Equestria o mesmo procedimento levava muito mais tempo para ser executado, mas por alguma razão o mesmo poder fluía naturalmente naquele lugar, provavelmente decorrente da necessidade que ela tinha de tornar a vida de Mel especial enquanto estivessem juntas. Foi onde ela se lembrou do que sua mãe havia dito ao afirmar que “quem ama de verdade procura sempre ser agradável aos olhos da pessoa que está amando”. Aquela motivação fazia uma grande diferença, e isso atraía pessoas que vinham até ela reverenciá-la. Eles traziam pedras comuns e pediam para transformá-las em ouro. Outros traziam dinheiro e suplicavam para ela “clonar” uma nota de cem em dezenas de notas iguais, e outros traziam veículos em péssimo estado de conservação, que Trixie conseguia fazer todos voltarem a ser exatamente como eram poucos minutos depois de saírem da linha de montagem. A unicórnio fazia suas vontades sem hesitar, tudo o que ela queria era tornar a vida preta e branca de Mel e daquelas pessoas colorida. Sua estadia temporária deveria ser repleta de boas ações.

Infelizmente, Trixie ainda não conhecia a verdadeira natureza dos humanos. Se por uma lado ela, como equestriana, fazia as coisas enxergando o sentimento deles, por outro a maioria dos terráqueos enxergavam interesse nela, especialmente aqueles envolvidos na guerra, observando em seu poder um potencial instrumento bélico.

De qualquer maneira, pela primeira vez ela estava vivenciando aquilo que sempre desejava: várias pessoas a admirando, e ainda que não fossem pôneis. Finalmente se sentia útil em alguma coisa, e sem fracassar.

Depois de passar o dia todo na cidade, Trixie voltava com Mel para casa, orgulhosa de si mesma. Estava se sentindo uma Celéstia dos humanos. A emoção era tanta que passou a decorar cada palavra do livro, para se certificar que pudesse voltar assim que o feitiço acabasse. Apesar disso, ela não trocava a humilde casa de Mel e Elen por uma mansão outrora oferecida pelo prefeito da cidade. A unicórnio não queria um “castelo”, apenas passar seu tempo com Mel enquanto o feitiço durasse, temendo não conseguir voltar mesmo memorizando cada palavra do livro.

Mas a fama às vezes a aborrecia. Quando Trixie queria ficar em paz, longe de tanta atenção, viajava com Mel para algum local isolado, onde as duas pudessem passar o tempo juntas. Seu lugar preferido era o pico mais alto de uma montanha onde a unicórnio adorava ficar aconchegada nos braços de Mel, esperando o pôr do sol que resultava em uma bela paisagem, tornando tudo ao redor alaranjado. Durante dois anos essa foi a vida de Trixie, ela estava tão apegada àquela humana que a tinha como filha adotiva, e não poderia suportar a ideia de regressar para Equestria sem ela.

O que as duas não sabiam, é que a guerra ainda não havia terminado. Numa certa manhã, Mel e Trixie acordaram assustadas com tanto barulho. Ao saírem da casa, se surpreenderam com vários veículos militares e um helicóptero que pousava bem próximo da casa delas. Trixie já havia visto a foto de uma aeronave daquelas em um jornal, mas nunca imaginou que fosse tão grande e barulhenta. Dele, saíram vários soldados e um homem mais velho, que era chamado pelos outros de General. Ele se dirigiu até elas, com sua vestimenta verde escura e várias insígnias no peito; em seguida removeu seu quepe meneando a cabeça levemente em sinal de cumprimento.

Ele explicou que a guerra havia chegado em um estado crítico, e queriam que Trixie os ajudassem com seus poderes mágicos a combater os inimigos. Elen concordava, afirmando que queria vingar a morte dos pais, mas Mel negou, pois não queria colocar a vida de Trixie em risco e nem ver ela fazendo mal aos outros. A unicórnio, obviamente, concordava com Mel. Depois de muita insistência, os militares acabaram indo embora insatisfeitos e Trixie voltava para dentro da casa com Mel montada nela. Elen adentrava a casa logo atrás das duas, as repreendendo.

“Não é um momento para pensar em virtudes, tem uma guerra lá fora e não podemos ficar de braços cruzados!” Dizia em voz alta.

“Se Trixie tiver que usar seus poderes contra alguém seria apenas em legítima defesa!” retrucava Mel.

“É isso mesmo, uma ursa maior só ataca quando é provocada.” Completava Trixie.

O dia seguinte passava normalmente, exceto pelo fato de Elen ter deixado uma carta avisando que não voltaria para casa naquela noite. Trixie estranhava, já que ela nunca havia feito isso antes, mas não deu muita importância. Durante a madrugada, enquanto as duas dormiam, um míssil caiu bem próximo da casa, mas a explosão foi suficiente para destruí-la por completo. Trixie acordava ferida, ainda sem entender o que estava acontecendo, mas tudo o que ela queria naquele momento era encontrar Mel em meio aos escombros. Ela ouvia seus gemidos, e logo levitou uma das paredes da casa. Mel não conseguia falar em função dos ferimentos, e Trixie não possuía nenhuma magia de cura, seu poder restaurativo funcionava apenas em objetos. Na escola de mágica ela queria se especializar apenas nas “mais chamativas possíveis”. A unicórnio entrava em desespero sem saber o que fazer, e logo surgiram os militares do nada para prestar socorro. Ferida na cabeça, Trixie acabava desmaiando.

Ao acordar, se viu em um hospital, e na cama ao lado estava Mel. Ela se levantava, ignorando a agulha com o soro, mesmo com as enfermeiras tentando impedi-la.

“Mel! Fala comigo!! Você está bem??”

Com os olhos vendados, Mel tentava encontrar Trixie com as mãos, finalmente encontrando um de seus cascos apoiado sobre a cama. “Eles disseram que vou ficar bem.”

Os médicos olhavam um para o outro com preocupação, alguns até saíam do quarto coçando a cabeça. A unicórnio percebia através de suas atitudes que havia algo errado.

O que foi?? O que ela tem??” perguntava Trixie.

“Ela… nunca mais vai enxergar, eu sinto muito.”

Por um dado momento, parecia que o coração de Trixie havia parado de bater. Ela não podia acreditar no que acabou de escutar. Durante os dois anos na Terra, Mel havia ensinando a Trixie o alfabeto local, ela sempre lia em jornais notícias sobre famílias perdendo suas casas e entes queridos, seja pela guerra, seja por crimes, uma dor que ela passou a sentir pessoalmente. Se recusando a sair do lado de Mel, as enfermeiras tiveram que improvisar a cama para comportar as duas. A unicornio passava o dia todo deitada ao lado dela, até que um dos médicos solicitou a presença da unicórnio em seu escritório. Não demorou muito para Trixie perceber que estava em um hospital situado em uma base militar. No escritório, se deparou com o mesmo General de antes, mais uma vez insistindo para Trixie ajudá-los a evitar que “mais inocentes fossem pegos em suas casas de surpresa”. Quando voltava para o quarto, viu Elen sentada na cama ao lado de Mel.

“Você estava certa Elen, fui egoísta e agora vou reparar meu erro. Quem fez isso com Mel vai pagar.” A irmã mais velha apenas sorria sem dizer nada.

No dia seguinte, Trixie estava dentro de um caminhão militar com doze soldados, e logo atrás vinha mais vinte e nove caminhões com a mesma quantidade de homens. Suas ordens eram de envolver todos em um campo de força enquanto atacavam os inimigos. Quando finalmente chegaram no campo de batalha, ela observava pela janela dezenas de helicópteros, soldados correndo pelos campos e explosões por todos os lados, uma cena mais assustadora do que qualquer conto de terror que ouviu em Equestria. Os caminhões paravam em meio ao combate onde os homens saíam às pressas empunhando suas metralhadoras, porém confiantes.

“Agora Trixie!! Nos envolva com o campo de força!!” falava o comandante da operação.

Porém, o inesperado aconteceu. Trixie não conseguia usar sua magia. Foi onde ela se lembrou que, dependendo de um estresse ou um trauma muito grande, um unicórnio poderia perder seus poderes mágicos por tempo indeterminado. E de fato, ser acordada na madrugada com a casa sendo destruída e descobrir que a pessoa que mais amava ficou gravemente ferida, era o pior dos traumas.

A derrota acabou sendo iminente, e não restou outra opção senão uma ação evasiva das tropas. Assim que voltaram para a base, Trixie era ignorada pelos soldados. Ela decidiu ir até o General explicar o motivo de ter perdido seus poderes, mas parou próxima da porta ouvindo pela janela do escritório uma conversa entre ele e outros militares:

“A ideia de provocar aquela unicórnio foi um fracasso, recomendo voltarmos à estratégia anterior.”

Enfurecida, Trixie corria até Elen, coiceando a porta do quarto com tanta força que uma das dobradiças chegou a se deslocar.

“Foi você que deu a ideia não é?”

“Eu não sei do que você..”

“Você falou pra eles atacarem a nossa casa!!! por isso deixou uma carta falando que não iria voltar naquela noite!!!

“Você disse que uma ursa maior só ataca quando é provocada…” respondeu Elen chorando. “Eu queria vingar a morte dos meus pais!”

“Nos sacrificando?? você acha que isso era mais importante do que a vida da sua irmã que acabou de arruinar??”

“Eu..eu…”

“Para o seu próprio bem não diga mais uma única palavra, pegue suas coisas e saia desse quarto agora! fique bem longe de nós!” finalizava Trixie apontando um casco para a porta.

Quando Mel recebeu alta, Trixie a levou de volta para sua província natal. Não foi difícil as duas ganharem uma casa nova na cidade que a unicórnio havia mudado completamente. Foram tempos difíceis, onde Trixie sem seus poderes tinha que ajudar Mel cega, já que Elen havia desaparecido após o sermão. Uma coisa que Trixie passou a sentir falta foi o fato de que ninguém mais a reverenciava ou lhe dava atenção como antes. Aqueles que viviam pedindo dinheiro, a idolatrando e a chamando de deusa, simplesmente desapareceram. Foi onde ela finalmente compreendeu que a natureza dos humanos não era enxergar sentimentos, e sim interesse. A própria doutrina religiosa dos humanos era diferente dos pôneis: dízimo para os humanos significava dar alguma coisa para receber outra em troca, mas para os pôneis, dízimo significava tão somente dar ou ajudar alguém de coração, sem esperar reconhecimento ou algo em troca.

Certa noite, quando Trixie estava voltando com as compras do jantar, viu dois veículos estacionados na calçada de sua casa. Ela soltava os pacotes que segurava com a boca e corria o mais rápido que podia, temendo que algo pudesse ter acontecido com Mel. Mas quando entrou, se deparou com os tios dela, além de Elen segurando várias malas.

“Nós viemos buscar Mel, ela terá um tratamento médico adequado em outro país”. Afirmou uma das tias.

Pensativa, a unicórnio apenas acenava. “Tudo bem, eu vou com ela.” Respondia Trixie. Mas a resposta dessa mesma tia a surpreendeu.

“De jeito nenhum, é por sua causa que nossa Mel está assim, se tivesse aceitado ir para a guerra, ela ainda estaria enxergando!” Foi a primeira vez que Trixie conheceu outros parentes de Mel além de Elen, e a frase “nossa Mel” soava no mínimo hipócrita para ela. Onde estavam esses tios e tias durante todos esses anos?

Enquanto eles levavam as malas para os carros, Trixie subia as escadas às pressas até o quarto de Mel, procurando por ela. Repentinamente, ouviu o som dos motores dos veículos e correu rapidamente para fora da casa, mas tudo o que a unicórnio presenciou foram eles partindo, sem nem mesmo ver Mel se despedir dela. Trixie ficava vários minutos parada, observando os veículos sumirem na neblina do anoitecer. Voltando para dentro da casa, ficava olhando os móveis, andando em círculos, era muita coisa para pensar ao mesmo tempo. De repente, e como em um irônico passe de mágica, a unicornio estava sozinha.

Fazia muito frio naquela noite, mas ainda assim ela caminhava pelas ruas mal iluminadas, até chegar nos campos desmatados, onde finalmente encontrou o penhasco em que havia caído no dia que chegou na Terra. Ficando parada em sua beira, com o vento gélido atingindo seu rosto, observava que a árvore que outrora salvara sua vida não estava mais lá, em seu lugar havia um grande entulho de veículos militares destruídos pela guerra. Com muitas lágrimas, ela fechava os olhos, meditando sobre tudo o que aconteceu. Alguma coisa a havia trazido àquele lugar, até observar que em meio ao entulho de ferro velho se encontrava uma antiga carroça.

Aquela visão a fez recordar de seu pai, de quem ganhou a carruagem mágica para apresentar seus shows. Ele dizia ser parecido com ela quando era jovem. Queria ser famoso e cheio de amigos a qualquer custo, até entender que isso não era importante. Os verdadeiros amigos ficariam ao lado dele independentemente de ser um grande mágico, orador ou qualquer outra coisa, lhe desejariam o bem e vice versa, enquanto que os amigos oportunistas sempre seriam as piores das companhias. E assim como ele aprendeu com seus erros, esperava que Trixie fizesse o mesmo, mas muitas vezes ela ia longe demais, até acabar destruindo a carruagem em Ponyville e manchar sua reputação.

 “Foi por isso que vim parar aqui pai. Porque não te ouvi.”

Trixie voltava para casa de cabeça baixa, tudo o que esperava agora era que o feitiço acabasse logo para regressar a Equestria, mas já fazia tanto tempo que estava na Terra que a unicórnio chegava a duvidar se isso realmente iria acontecer. Chegando em casa, ela se deitava na cama, esgotada até mesmo para puxar a coberta com os dentes. Aos soluços, fechava os olhos ainda não acreditando no que aconteceu. De repente, sentia uma mão calorosa tocar em suas costas.

“Não precisa chorar, eu nunca vou te abandonar.”

Era a voz de Mel, ajoelhada na cabeceira da cama com os olhos fechados, finalmente encontrando a crina de Trixie para acariciá-la. A unicórnio se levantava surpresa.

“Me..Mel?? mas eu vi você indo embora!”

“Eu sei, briguei muito com eles por me colocarem à força dentro do carro, e principalmente porque não me deixaram nem mesmo ver você.”

“Mas… como você os convenceu a voltar?”

“Eu ofereci a eles o restante do ouro que nós escondíamos no porão em troca de me deixarem ficar.” Pausava, suspirando. “Eles não hesitaram em nenhum momento… mesmo não podendo enxergar sei que foram embora com sorrisos nos rostos.”

“O ouro guardado no porão?? Mas precisávamos dele para comprar seus remédios Mel..” Continuava aos soluços. “Acho que nunca falei isso antes, mas me perdoe por não ter ido naquela guerra…”

“Trixie, o que aconteceu com meus olhos não foi culpa sua, foi culpa da minha irmã. Você sim foi uma verdadeira irmã, e até mãe. Prefiro perder todo o ouro do mundo do que perder você. Com ou sem magia eu te amo!”

Trixie recebia um caloroso abraço de Mel, era como um remédio curando todas as suas frustrações e afastando os sentimentos ruins. Finalmente ela compreendeu o que o seu pai queria dizer. Os verdadeiros amigos o amam por quem você é, e não pelo que pode fazer ou tem a oferecer. Aqueles que a idolatravam, logo a abandonaram quando souberam que não poderia mais usar sua magia, quando não teria mais nada a oferecer. Mas Mel, mesmo sem enxergar, ainda estava ao seu lado, e sempre estaria, até o fim. Pela primeira vez, Trixie enxergava a vida sob uma perspectiva completamente diferente. Não dava mais a mínima se alguém a achava a “grande e poderosa Trixie” ou uma simples pônei. Ela estava feliz do mesmo jeito.

Infelizmente, a guerra ainda não havia terminado, e em plena luz do dia ouviu-se uma sirene na cidade; muitos corriam desesperados para se abrigarem e outros com seus carros tentavam fugir em meio ao congestionamento. Mais uma vez, Trixie observava dezenas de aviões sobrevoando a cidade, e dessa vez estava claro que não era outra armação do General e Elen.

Ela ajudava Mel a montar em suas costas e corria o mais rápido que podia para o porão antes que o bombardeio começasse. Depois de ficarem várias horas presas, Trixie conseguia sair do porão, onde se deparava com uma cidade em ruínas e ainda em chamas. Ela ajudava Mel, onde ambas caminhavam pelo que restou das casas e prédios. Repentinamente, são surpreendidas por vários soldados armados. Naquele momento de tensão, Trixie se posicionava na frente de Mel, disposta a protege-la até o fim, mas ambas são atingidas por dardos tranquilizantes, como se aquele exército não estivesse apenas invadindo a cidade, mas à procura delas.

Trixie acordava acorrentada em uma jaula, com vários soldados e aquele mesmo General de antes junto deles. A unicórnio não o encarava tão surpresa dessa vez. “Traiu seu país General??”

“Pelo contrário, ofereci você e seu poder de transformar objetos brutos em riqueza em troca de uma aliança, nada mais.”

“EU NÃO CONSIGO USAR MEUS PODERES E VOCÊ SABE DISSO!” respondia enfurecida.

“Isso não é mais problema meu, por que você acha que está em um laboratório?”  

Dentre os aliados, ela observava vários homens vestindo jalecos brancos. Eram cientistas, e estavam lá para estudá-la, talvez por isso mesmo que estivesse tão bem acorrentada.

Nada do que eles tentavam dava certo para aprenderem sobre os poderes de Trixie, e mesmo em meio à dor de injeções e descargas elétricas, Trixie só conseguia pensar em Mel, até ficar inconsciente. A unicórnio acordava ao som de vários helicópteros sobrevoando a base, o laboratório estava vazio e o relógio na parede indicava duas da manhã. Essa era a única chance que ela poderia ter de escapar. Apesar de estar bem acorrentada, ela ainda tinha seu chifre de unicórnio. Em suas apresentações costumava usá-lo para abrir fechaduras aparentemente insuperáveis. Primeiro tentou nas correntes dos cascos, e conseguiu se livrar deles, depois na porta da jaula, e mais uma vez obteve êxito. Ela pulava para fora, com o cuidado de não fazer barulho. Tudo o que queria era encontrar Mel e sair de lá o mais rápido possível.

A unicornio se dirigia até a janela, onde observava soldados fazendo ronda. Cuidadosamente a abriu e utilizou seu faro aguçado para tentar encontrar Mel. Finalmente, ela chegou até uma enorme grade no chão, era uma espécie de fosso onde ficavam os prisioneiros. Quando olhava para baixo, observou Mel junto deles. Trixie pedia para não fazerem barulho enquanto abria a grade com seu chifre.

Mel!” As duas se abraçavam no que parecia ser uma eternidade.

“Eu sabia que você viria.” Dizia Mel.

Trixie a beijava na testa. “Nós fizemos a promessa Pinkie Pie de nunca mais nos separarmos de novo.” Porém, antes que pudessem achar uma saída, o alarme disparava, e vários soldados gritavam que a unicórnio escapou. Sem ter tempo de pensar em algo, Trixie, Mel e os outros prisioneiros já haviam sido rapidamente abordados.

“Voltem para a cela agora!”

“NÃO!” dizia o General saindo das sombras. “Punam esses como exemplo e levem a unicórnio de volta para o laboratório.”

Trixie era mais uma vez acorrentada e observava Mel e os outros prisioneiros caminhando até o centro do pátio. Quando pararam, vários soldados apontavam suas armas para eles, fazendo a unicornio entender o que seria a punição ordenada pelo General.

Foi o pior erro dele. Se um trauma fazia os unicórnios perderem seus poderes, agora Trixie descobriu que o desespero de salvar alguém poderia fazer exatamente o contrário. O que aconteceu com Trixie naquele momento foi exatamente o que ocorreu com Twilight Sparkle no dia que ganhou sua marca especial. Seu corpo foi envolvido por uma enorme aura de energia azulada que destruiu facilmente as correntes em seu corpo. Assustados, os soldados atiravam nela, mas nada acontecia. Com seus olhos brilhando, ela fazia os soldados flutuarem e em seguida os arremessava para longe. Porém, mais soldados apareciam, e dessa vez disparos de bazucas eram deflagrados contra ela, levantando uma cortina de fumaça. Com uma aparente vitória dos soldados em meio à poeira levantada, o céu começava a se encher de nuvens negras, e relâmpagos enfurecidos caíam sob a cabeça dos soldados que fugiam em pânico.

“Liberem o protótipo dos alemães!” gritava o General. Um tanque modelo Panzer, o mais avançado da época, surgia em meio à confusão apontando seu canhão contra Trixie. Em seu interior, o piloto esboçava um sorriso malicioso quando a unicórnio ficava em sua mira, mas tudo o que ele viu em seguida foi uma enorme rajada de energia vindo em sua direção, e repentinamente não havia mais tanque e nem piloto, apenas uma enorme e funda cratera. Desesperado, o General subia abordo de um helicóptero, ordenando que o piloto disparasse todos os mísseis contra ela. A segunda decisão mais infeliz que poderia tomar.

Trixie fez o helicóptero se teleportar bem na frente dos mísseis disparados por ele mesmo, não sobrando nada além de uma bola de fogo e metais retorcidos.

Assustados com seu poder, os outros soldados fugiram, e os prisioneiros finalmente estavam livres. Mel era ajudada pelos outros a chegar até Trixie, mas a unicórnio sentia que havia algo errado, ela não conseguia se mexer.

T-Trixie? Tudo bem?”

“Tem.. alguma coisa errada Mel.. eu me sinto…”

De repente, um clarão de luz a envolvia, e quando cessou, ela estava dentro da biblioteca de Canterlot. Os pôneis que consultavam livros observavam pasmos aquela unicórnio azul aparecer do nada cheia de ferimentos e cicatrizes. O feitiço havia terminado, e Trixie finalmente voltou para Equestria. Desesperada, se lembrou que o livro foi destruído na Terra junto com a casa de Mel e Elen, a impossibilitando de memorizá-lo por completo. Então decidiu partir para seu único recurso. Explicou para Celéstia o ocorrido e pediu para ajudá-la a voltar. As duas seguiram até a biblioteca, e Celéstia explicou a Trixie que havia usado o livro errado. Aquele era para viajar no espaço tempo dimensional e não somente no tempo, embora ambos tivessem o mesmo efeito de manter seu usuário temporariamente deslocado no espaço tempo. O período de Trixie na Terra havia se esgotado, embora mesmo assim foi uma surpresa ela ter ficado tanto tempo.

Além disso, Celéstia considerou os livros perigosos e ordenou destruir todos os exemplares restantes. Salientou que levaria pelo menos um mês para fabricar um novo, e devido à experiência que teve com uma pégasus, Celéstia explicou que um dia em Equestria correspondia a um ano na Terra, e que portanto, até o livro ficar pronto, já teriam se passado trinta anos na Terra.

De fato, Trixie percebeu que pouca coisa mudou ao seu redor. Enquanto passou dois anos na Terra, só havia passado dois dias em Equestria. Desesperada, a unicórnio ignorava Celestia e procurava por outro livro nas prateleiras, derrubando uma atrás da outra. Sentindo seu desespero, Celéstia usou sua mágica para fazê-la dormir. Quando acordou, estava em seu quarto, com seus pais sentados ao lado dela, explicando que já sabiam do ocorrido. Por horas eles ficavam conversando, e no final seu pai apenas dizia para ela ter fé que tudo acabaria bem.

Mesmo assim foi o mês mais longo para Trixie. Quando veio até ela a notícia de que o livro estava pronto, ela correu ansiosa até Canterlot para se encontrar com Celéstia. A Princesa, no entanto, parecia menos otimista do que Trixie, como se já soubesse qual seria o resultado.

“Tem certeza que quer fazer isso?”

“Por favor Princesa, eu prometi que nunca iria abandoná-la.”

Assim, Celéstia iniciou a magia e ambas foram imediatamente teleportadas para o local onde Trixie havia recuperado seus poderes. De fato, puderam comprovar que já havia passado trinta anos naquele mundo. Aquela base militar estava às ruínas e cheio de matagal, e ao seu redor, que antes era uma floresta, prédios por todos os lados. Foi quando avistou no centro daquela estação abandonada uma estátua de bronze, que parecia ser de uma unicórnio e uma criança montada nela.

Quando se aproximaram mais, não restava dúvidas que a estátua representava Trixie e a criança montada, Mel. Em sua base havia uma placa com uma mensagem. Obviamente, Celéstia não entendia o que estava escrito, mas Trixie sim. Na placa estava os dizeres: “Em homenagem à unicórnio Trixie e a todos os prisioneiros que morreram como heróis naquela noite, ao derrotarem o General e ditador deste Estado.”

Trixie deduziu que após o seu desaparecimento, os soldados voltaram para a base. A unicórnio repousava sua cabeça aos soluços na estátua. Não restava nada mais a ser feito, senão voltar para Equestria. Mas Trixie se negava, ela ativava sua magia, tentando rastrear Mel, mesmo com Celestia afirmando que ela não estava mais naquele mundo. Não aceitando tal afirmação, ela corria em direção aos prédios, até ser detida por um feitiço de Celestia que a fez dormir novamente. Cuidadosamente, a Princesa a colocou em suas costas, e ambas retornaram para Equestria.

A unicórnio nunca mais se interessou em apresentar shows, e passava a maior parte do tempo trancada em seu quarto. Seus pais ficavam preocupados, e passavam horas conversando com ela, tentando ajudá-la a superar sua tristeza. Depois de tudo o que aprendeu na Terra, Trixie não se permitiria decepcionar seus pais novamente, ou deixar de escutá-los. Por isso, tentou voltar a ter uma vida normal, por eles e por Mel. Certo dia, assistiu a celebração do dia das mães, onde ficou sabendo que Rainbow Dash havia adotado Scootaloo.

Ela se lembrou que Mel e Elen também eram órfãs. Imaginou que talvez seu destino não fosse ser mágica, embora sua marca especial mostrasse o contrário. Mas agora entendia que Mel só havia reencontrado a felicidade após a perda dos pais, quando a conheceu, e que talvez pudesse fazer o mesmo pelas crianças de Equestria. Assim, ela foi até o orfanato local, os funcionários que conheciam Trixie e seu temperamento se surpreenderam ao ver a unicórnio se dar tão bem com as crianças.

Sob ordens de Celéstia, foi concedido um emprego à Trixie no orfanato, e ela sempre era motivo de alegria para as crianças. O tempo foi passando, e Trixie finalmente havia encontrado a paz consigo mesma. Certo dia, Celéstia foi ao orfanato visitá-la, onde a encontrou trabalhando no pátio.

A unicórnio se curvava para ela em sinal de respeito, mas as crianças só fizeram o mesmo depois que Trixie pediu. Celéstia sorriu.

“Vejo que está fazendo um ótimo trabalho Trixie.”

“Obrigada Princesa, como posso ajudá-la?”

Celéstia revelava debaixo de suas asas uma pônei terrestre de apenas três anos de idade. “Fiquei sabendo que ela não tinha onde ficar”.

 “Olá minha querida!” Dizia Trixie se aproximando dela. A unicórnio azul a abraçava carinhosamente, até que ao olhar mais atentamente para ela, viu algo familiar em sua crina castanha e olhos verdes.

“Qual o seu nome?”

 “M-meu nome é Mel!”

Lágrimas escorriam pelos olhos de Trixie.

“Vocês prometeram ficarem juntas para sempre!” Dizia Celestia.

Aos soluços, a unicornio abraçava Mel, sentindo a mesma energia da humana com quem aprendeu o verdadeiro significado da vida. Agora nada e ninguém iria separá-las novamente.

A marca especial de Trixie continuava a mesma, exceto pelo fato que na extremidade da varinha de condão não havia mais uma estrela, e sim um coração.